Escrito por: Mauricio Goldstein
Nas últimas semanas, estive nos Estados Unidos visitando empresas que operam com um modelo de organização inovador. Uma das empresas que visitei era uma cooperativa chamada REI (Recreational Equipments Inc.) Fundada em 1938 por 23 montanhistas, a REI se especializou em vender vestuário e equipamentos para esportes na natureza. A rede possui 123 lojas em 30 estados americanos, faturou, em 2011, US$ 1,8 bilhão, tem 11 mil funcionários e foi a 8ª empresa na lista da Fortune “Melhores empresas para se trabalhar” em 2012.
O interessante é que ela consegue tudo isto sendo uma cooperativa de membros. Ou seja, qualquer pessoa que tenha interesse (clientes, empregados, fornecedores) pode se tornar um “dono” da REI por US$ 20. Todo mês de março, os membros ativos recebem dividendos (tipicamente, 10% de seus gastos na rede). Eu me tornei um membro e com isto, recebi um folheto que explica meus direitos e deveres.
Logo no início do folheto, há uma manchete dizendo “a diferença das cooperativas” que introduz o texto seguinte: “ser uma cooperativa significa que podemos dirigir nosso negócio de um modo diferente. Nós respondemos para você, não para os acionistas ou para o resultado trimestral. Isto permite que a REI tenha uma perspectiva de longo prazo e mantenha o foco em levar pessoas aos esportes na natureza e em ajudar na preservação.” A energia que senti na loja de empregados e de compradores era de uma grande comunidade, todos voltados para o mesmo objetivo.
Comecei a pensar como empresário e, financeiramente, percebi que o retorno não é maior do que o retorno de alguns programas de fidelidade, onde o associado recebe um desconto em suas compras. Mas de fato, a relação dos membros com a REI é muito diferente: eles são donos, votam no comitê diretivo, recebem dividendos (e não descontos)! E isto traz uma conexão muito diferente entre o “cliente-membro” e a REI (eu mesmo tenho vários cartões de fidelidade com companhias aéreas, e juro que isto não me faz sentir um vínculo especial com elas).
Isto me remete aos times de futebol. Sempre fiquei intrigado em compreender melhor como os times de futebol, sem oferecer nenhum retorno financeiro, conseguem com que seus “clientes-torcedores” sejam tão apaixonados pela sua marca, que chegam a brigar na rua. Eles criam o mesmo efeito de comunidade, da qual seres humanos querem fazer parte. Eles tocam o coração das pessoas… E vários empreendedores perceberam isto e começaram a criar lojas como a Loja do Flamengo, a Shop Timão ou o Mundo Palmeiras, para alavancar esta conexão (alguns de vocês já podem até estar desconfortáveis por eu não ter mencionado o nome de seu time, não é?).
E não é isto que toda empresa gostaria? Ter clientes tão fiéis, apaixonados pela sua marca e seus produtos, que compram com frequência e ainda promovem a marca?
A questão aqui é ir além do “foco no cliente”, mudar a fronteira de concepção do negócio – como trazer o cliente para dentro do sistema? Na REI, por exemplo, o cliente faz parte do negócio, toma decisões relevantes, não é um ser externo. A empresa e o cliente compartilham de uma conexão por uma causa, e todos os clientes formam assim uma grande comunidade, com uma relação emocional. Isto torna a empresa humana e não apenas um objeto numa relação comercial.
Várias empresas já perceberam o potencial da participação do cliente em seus negócios e estão cocriando produtos e serviços. Mas aqui estou falando de uma transformação mais significativa do que a mudança de processos: a transformação do modelo mental!
Como convidar o cliente genuinamente para dentro de seu sistema, para dentro de sua comunidade, para compartilhar a causa da sua organização? E como operar de forma coerente com este novo modelo mental? As organizações que conseguirem fazer isto, sem dúvida, prosperarão num mundo onde as pessoas estão cada vez mais influentes, querem ter voz e buscam um significado.
Fonte: Site Harvard Business Review, 04 de junho 2012
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