Até pouco tempo atrás, a pressa era o principal fator que conduzia os processos seletivos da Kalunga, rede de papelaria e materiais para escritório. Para suprir a demanda que só crescia, os gerentes das lojas ouviam um candidato e logo o contratavam para o atendimento. Há 25 anos na companhia, Hélio Shimba, gerente da regional de São Paulo, já presenciou situação pior. “No passado, as admissões eram feitas diretamente pelo departamento pessoal, sem a participação do gerente, e o funcionário chegava aprovado na loja”, conta. O resultado de processos acelerados e não integrados foi o aumento do turnover da rede, que alcançou os 58%. “O processo de seleção estava todo errado”, concluiu Márcia Assim, quando ingressou na rede em 2008 para assumir a gerência de recursos humanos. Até aquele ano, não havia um RH estruturado na companhia, tampouco processos de seleção moldados. Embora significativa, a taxa de rotatividade não parecia dizer muita coisa para os gerentes das lojas. Era preciso mais. E Márcia, então, fez as contas. “Mostramos que um processo de seleção mal conduzido eleva os custos da rede”, afirma. Na fórmula, foram considerados os custos da divulgação da vaga, do processo de seleção, da admissão, da integração e do desligamento.

Susto coletivo
Com os valores na ponta do lápis, a gerente de RH apresentou os resultados. “Todo mundo levou um susto”, conta. A partir daí, o setor movimentou forças para mostrar que, além de reduzir valores, a escolha bem feita dos profissionais acarretaria mudanças na qualidade do atendimento e os frutos seriam colhidos a médio e longo prazos. “Os gerentes não tinham paciência para conversar com mais candidatos e queriam contratar rápido. Mas mostramos que esse processo não é perda de tempo”, afirma. 

Por decidirem quem entra e sai das lojas, os gerentes foram o primeiro foco das mudanças. A ideia foi fazê-los perceber que era preciso participar de maneira mais ativa da seleção, ouvindo mais pessoas, analisando-as com cuidado e fazendo as perguntas certas. “Eles sequer olhavam a carteira de trabalho do candidato. E o documento diz muito sobre ele”, conta Márcia. Até um roteiro básico de perguntas foi preparado pelo setor e enviado aos gerentes para que tenham parâmetro. Além disso, eles recebem treinamento constante para escolher bem os funcionários e têm à disposição selecionadoras que esclarecem dúvidas.  Uma das mudanças mais significativas foi colocar a rotatividade como um dos indicadores que compõem a análise anual de todas as lojas da rede. Aquelas com as melhores pontuações recebem prêmios no final de ano. “Quando colocamos o turnover como um dos indicadores de desempenho da loja, os gerentes começaram a se preocupar”, conta a executiva. Dessa forma, quem selecionava melhor retinha mais gente e conseguia mais pontos. 

No primeiro momento, a preocupação era a busca pelas melhores pontuações. Aos poucos, no entanto, houve a percepção de que, bem selecionados, os atendentes rendiam mais. “Percebemos isso pelo interesse dos gerentes em tirar dúvidas sobre o processo e também na preocupação de ligar e dizer os motivos do desligamento de algum funcionário”, conta a executiva de RH. Para Shimba, houve ganhos em produtividade. “Já tínhamos a percepção da importância do processo de seleção porque víamos muitos candidatos sem perfil, muitos saindo e outros desistindo. Mas quando o gerente realiza esse processo com atenção, ele consegue adequar o perfil do candidato às necessidades da loja”, observa. Como gerente regional, Shimba acompanha os processos de seleção, mas a palavra final continua com os gerentes das lojas. O perfil dos atendentes também mudou. Antes, conta ele, os funcionários tinham baixo grau de escolaridade, ao contrário dos candidatos de hoje, mais preparados. “Conseguimos trabalhar o desenvolvimento humano”, avalia. Com as mudanças, o turnover caiu de 58% para 42%, de acordo com a gerente de recursos humanos.

Avaliação e treinamento
Não é apenas uma seleção mal conduzida que interfere na taxa de turnover de uma empresa. Para avaliar se o problema está no gerente da loja ou no funcionário, o setor de Márcia também conduz uma pesquisa de loja em loja, para verificar os motivos das saídas. “Quando vemos que está muito relacionada ao gerente, vamos conversar com a regional e fazer um trabalho focado nessa loja”, afirma. 

O programa de trainees também faz parte das mudanças de concepção da seleção da rede e tornou-se pilar da empresa, a fim de ter gerentes mais preparados para escolher funcionários a longo prazo. Hoje, o programa possui três etapas: uma de treinamento nas lojas; outra mais administrativa, na qual os trainees conhecem os departamentos da rede; e a terceira é uma imersão no departamento de recursos humanos, ocasião em que são tratados temas como liderança, equipe e administração do tempo.”Após o treinamento, os novos gerentes assumem a loja com plena consciência dos procedimentos de todas as áreas da empresa, bem como dos custos envolvidos com o patrimônio, equipe e infraestrutura. Dessa forma, os recém-chegados vêm com conhecimento pleno dos modelos de liderança que esperamos encontrar na equipe”, ressalta a executiva. 

As mudanças na condução dos processos também são parte do processo de expansão da Kalunga. A companhia faturou 1,130 bilhão de reais em 2011, com 78 lojas. Para 2012, a previsão é fechar o ano com faturamento de 1,350 bilhão de reais e um total de 100 lojas. Hoje, a rede possui 2.340 funcionários, sendo 1.870 distribuídos nas 92 lojas existentes. Ao todo, existem 122 gerentes, sendo 100 os de loja. Para cada loja, a média é de 22 funcionários. Com o crescimento da rede, os processos de seleção precisam ser cada vez mais efetivos, afirma Hoslei Pimenta, diretor comercial da companhia. “Não dá para expandir sem gente qualificada”, diz. De acordo com ele, além da queda nas despesas, as perdas em vendas também diminuíram com a seleção mais estruturada, uma vez que houve aumento na qualidade do atendimento nas lojas. “Quando você mantém uma equipe por mais tempo, ela fica mais qualificada”, avalia. 

Fonte: Revista Melhor Gestão de Pessoas, nº 301

 

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